Pesquisar este blog

segunda-feira, 9 de junho de 2014

Abaixo a mulher mulherzinha!

A despeito de todas as conquistas do movimento feminista, esse avanço não tem chegado integralmente a todas as esferas que cercam a vida da mulher. O lado profissional, que é sabido ainda não ser plenamente igualitário*, talvez tenha apresentado, por incrível que pareça, mais avanços que o lado sentimental. Mesmo que haja aqui e ali exemplos de mulheres que seguem suas vidas sem se importar com regras sociais originadas em séculos passados, não são poucas as que ainda as seguem e, pior, as defendem – inclusive muitas bem-sucedidas profissionalmente e de elevado nível cultural. 

Libertar a mulher, hoje, passa necessariamente por afastá-la da ideia do amor romântico como o conhecemos. Quantas não desperdiçam suas vidas em busca de um “príncipe” que trará sentido a suas vidas? Quanta energia e esforço não é perdido perseguindo esse ideal quase utópico? A farsa da idealização de um parceiro serve apenas para encaminhá-las ao sofrimento. De tão convencidas que são por essa ideia, dão mais importância à relação que ao companheiro em si. Elas criam uma máscara e saem em busca de alguém que a use. Dessa forma, ignoram quem essa pessoa realmente é, com suas virtudes e, principalmente, seus defeitos. Quando a euforia inicial do romance passa, e finalmente enxergam quem os parceiros realmente são, se desesperam por terem criado para si uma ilusão que lhes tomou tanto tempo – já que vislumbram os romances como investimento.

Se as mulheres são vistas como inferiores por muitos homens, é simplesmente porque muitas assumem tacitamente esse papel. Condicionam sua felicidade a um relacionamento. Se não estão em um, sentem-se infelizes e fracassadas. Insistem em relações desastrosas porque acham que nunca irão encontrar outra pessoa. Viver um grande amor é o principal objetivo de suas vidas, atrapalhando muitas vezes que foquem em outras questões, como estudos e profissionalização. Realizam sexo ultrajante pela simples obrigação de uma relação infeliz – e preferem isso a uma noite de prazer descompromissado onde há respeito mútuo. Tem-se que destruir a imagem da mulher incompleta, que necessita de um homem a seu lado para ter um sentido na vida, do homem que tem que pagar sua conta e sustentar a casa. Da princesa que precisa ser resgatada porque não consegue fazer nada sozinha. 

É preciso jogar fora o papel da mulher coitada que tem que esperar o homem vir até ela. Da mulher que envia mensagens secretas às nuvens na esperança de que os homens pelos quais se interessa as interpretem. Não à toa os homens de caráter duvidoso se saem bem no quesito número de conquistas. Como não têm escrúpulos, atiram-se à tarefa do galanteio sem considerar quaisquer consequências. E, uma vez que as mulheres estão à espera de que alguém lhes venha falar, consideram que eles são verdadeiros apenas por isso. Iludem-se e voltam a iludir-se, repetidas vezes, criando a partir de experiências ruins ideias deformadas sobre todos os homens. Muitas preferem viver infelizes e frustradas a tomarem uma iniciativa. Preferem permanecer na comodidade de seus lugares, experimentando apenas as oportunidades que lhes chegam, em vez de abandonarem essa posição limitante e ampliar as possibilidades de boas experiências.

Para libertar a mulher, nesse nosso século, temos de quebrar a promessa da certeza do amor eterno a qual todos têm direito – mas pouquíssimos encontram. Temos que explodir a condição da mulher que abre mão de sua vida, se limita, se anula, mente para o parceiro e para si mesma a fim de fazer um relacionamento dar certo. Da mulher que assume todas as tarefas e responsabilidades do lar sem exigir ou consentir que o marido tome parte nelas. Que precisa de um divórcio para compreender que ainda está viva, que não existem contos de fadas e que tem à disposição mais escolhas do que imagina. Abaixo a mulher que se humilha, que se deixa agredir – física ou psicologicamente –, que critica as que tentam quebrar esse paradigma. Fora com a mulher que pecisa de falsas juras de amor para se entregar ao prazer das carícias; que dissemina que sexo só interessa ao homem; que se sente depravada ao fazer sexo casual; que pede desculpas por ser “oferecida”. Desfaça-se a ideia de que amor, paixão e sexo se confundem. Que se ponha um fim no número de mulheres que fazem sexo forçado em relações estáveis mais do que no meretrício. Sem isso, outras conquistas têm sua importância reduzida. Essa mudança deve partir do interior de cada um – homens e mulheres –, senão corre-se o risco de termos uma sociedade onde o avanço das mulheres não passa de teatro. Esses mitos é necessário derrubar. 


*E aqui é necessário fazer um adendo: não conheço bem como essas pesquisas são conduzidas, mas desconfio de que muitas chegam a conclusões sobre diferenças de gênero no âmbito laborativo a partir de confusões estatísticas, seja de amostragem, seja de interpretação de resultados.