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segunda-feira, 27 de maio de 2013

Uma revista e suas críticas

Recebi hoje a notícia da morte do idealizador da revista semanal de maior circulação do país. Não conheço nada em particular dele, mas conheço razoavelmente a revista, pois já li diversos exemplares. A notícia me fez lembrar várias críticas que já ouvi e vi a respeito desse semanário, e que, em minha concepção, chegam a ser injustas, pois já me senti ofendido com tais ataques.

É fato que cada publicação tem sua própria linha de pensamento, baseada em alguma filosofia, crença ou postura política. É isso que a leva a aderir à uma determinada bandeira ou atacar alguma causa. O texto neutro, se existe (alguns afirmam que não, mas isso é discutível), é bastante raro e não caberia a um informativo desse porte. Mas a diversidade de ideias é salutar e necessária. Apenas regimes totalitaristas e sanguinários admitem apenas uma linha de pensamento, destinando à morte ou ao desterro os simpatizantes de outras ideias. Gostaria de saber se é esse tipo de governo que esses críticos apoiam para o Brasil.

Percebe-se o fim de um diálogo razoável quando alguma das partes envolvidas deixa de lado os argumentos e parte para a ofensa pessoal. Os detratores da revista citada acima normalmente se enquadram nesse perfil. Ora, se eu não concordo com determinada publicação, basta não lê-la, da mesma forma que não vou a lugares onde não gostaria de estar. Posso também argumentar ao contrário, mas não é de bom tom atacar os leitores, até mesmo porque há uma infinidade de motivos para que estes a leiam. É essa a mesma motivação que leva fanáticos religiosos a mutilarem e trucidarem pessoas alheias a suas crenças, apenas por discordar delas ou nem sequer as conhecerem.

Cumpre lembrar que uma revista desse nível contém diversas seções, indo da política à televisão, da música aos esportes, da economia ao glamour, entre diversos outros assuntos. O que muita gente não quer aceitar é que se trata de uma publicação que serve a vários propósitos, e ninguém é obrigado a ler o periódico inteiro, mas apenas as partes que lhe interessam. É imoral difamar todas as reportagens baseado apenas nas primeiros páginas, destinadas à política. Devo dizer que, entre todas as revistas do tipo que já li, seus artigos são os mais bem escritos. Nunca concordei com todas as suas opiniões, a exemplo de sua defesa veemente dos alimentos transgênicos, os quais nunca vi com bons olhos. Também não nutria simpatia por todos os seus colunistas, mas alguns eram brilhantes.

A revista pode ser acusada de ocultar informações, sem dúvida, mas onde estaria a validade desse argumento, quando até os governos vermelhos – idolatrados por esses mesmos críticos – evitam que se disseminem as muitas mortes promovidas por eles, assim como a restrição total da liberdade de expressão?

A intolerância se manifesta de várias formas, inclusive quando ânimos exaltados acreditam que são donos da verdade, ou que existe apenas uma versão verdadeira do mundo. Todos os fatos nunca virão de um único lado, seja por convicção ou desconhecimento. Beber de várias fontes é o melhor caminho para diminuir a ignorância e a visão parcial de tudo quanto acontece no mundo. Como não leio mais a seção de política de qualquer revista que seja, creio poder julgá-las melhor baseado em uma visão geral e não partidária.


quarta-feira, 22 de maio de 2013

A mulher típica

A mulher típica não sabe usar
nem o “sim” e nem o “não”
Usa o “sim” pra negação
e o “não” para afirmar
E ainda quer que aceitemos
como comunicação
essa forma de falar

A mulher típica quer ser bela
Vive uma grande disputa
Se uma muda, a outra muda
e nenhuma fica quieta
Mas ninguém pode falar
que a beleza é sua meta
e tem isso por usura

A mulher típica se deixa levar
pelas novelas que assiste
e também outras crendices
que falam de amar
Se ilude e fica boba
e no final acaba triste
só restando então chorar

A mulher típica não confia
em seu próprio companheiro
Ela o segue o tempo inteiro
Todo o tempo o vigia
Mas acaba se esquecendo
que vigiar o que é alheio
é esquecer da própria vida

A mulher típica é de insistir
em relações já sem afeto
Não admite que o mais certo
nesse caso é desistir
Pra ela amor é investimento
que oferece juro eterno
e que se tem que usufruir

A mulher típica é de fazer
umas perguntas sem sentido
ao namorado ou marido
que é obrigado a responder
O que ouve a desagrada
mas ela sempre insiste nisso
por esporte ou por lazer

A mulher típica é de guardar
os deslizes do parceiro
Mesmo os que não foram erros
e que diz os perdoar
Até à morte rememora
mesmo os fatos corriqueiros
num bizarro recordar

A mulher típica sempre nega
sua vontade e seu desejo
e nesse louco devaneio
ao insistente é que se entrega
Mas esse é sempre o cafajeste
que a deixa em desespero
ao ver de fato quem ele era

A mulher típica, sem iniciativa
fica à espera de seu par
que alguém lhe venha falar
Como uma estátua é passiva
E depois estranhamente
quer dessa pessoa reclamar
como se fosse sua conquista

A mulher típica é incompleta
Busca sempre ter alguém
Não importa muito quem
se lhe serve como perna
Não sabe ser sozinha
Não se conhece a si também
pois é muito pouco esperta

A mulher típica é assim
não sabe o que quer
ou que homem escolher
E ainda acha ruim
ao se ver perdida
num mar de sofrer
em lamento sem fim

A mulher típica
e o homem típico
se merecem

terça-feira, 14 de maio de 2013

Sugestão de leitura




     Título: O Fole Roncou – Uma História do Forró
     Autores:  Carlos Marcelo e Rosualdo Rodrigues
     Editora: Zahar
     ISBN: 978-8537-809-167






Muito se tem dito e feito para salvar do esquecimento culturas que correm risco de extinção devido ao avanço de outras culturas supostamente superiores e de certa imposição social ou apreço popular. Aqui no Brasil, o principal foco dos estudiosos são as tribos indígenas espalhadas país afora, com seus costumes, rituais, idiomas e músicas próprios. No entanto, passa ao largo desse esforço uma cultura tão rica quanto aquela autóctone – a do povo nordestino.

Os nordestinos têm um linguajar próprio, constituído por palavras herdadas do período colonial e do império, gastas pelo uso de anos, adaptadas à realidade da região, quase irreconhecíveis frente aos vernáculos originais. Também são criadores de palavras, e, levando em conta a extensão do território, a profusão de termos peculiares é extensa. Sua culinária, se por um lado é restrita em ingredientes – dada a natureza pouco dadivosa que os sustentam –, por outro espraia-se em quitutes os mais variados, limitados apenas pela criatividade desse povo. Suas lendas, se contadas todas, renderiam uma infinidade de livros, assim como sua sabedoria, seja na arte medicinal – também repleta de superstições – ou conhecimento geral do ambiente onde vivem. Mas esse povo, duro, forte devido ao sofrimento das agruras do sertão, tem nas artes sua melhor representação. Que o diga os artíficies de madeira, palha ou pedra, ou a bem conhecida literatura de cordel, prova incontestável da capacidade de improviso e composição dessa gente. Mas é a música talvez a expressão mais característica dessa região. É o meio através do qual, em sua simplicidade agreste, o homem comum dialoga com a natureza e expressa as poucas emoções que sente. E foi através de uma música feita por essa gente que o país aprendeu a cantar a vida nordestina e descobrir seus encantos.

O Fole Roncou – Uma História do Forró, de Carlos Marcelo e Rosualdo Rodrigues, é a história de como isso aconteceu. Os autores, nordestinos da Paraíba, apresentam em sua obra o resultado de extensa pesquisa realizada através de entrevistas, livros, jornais, revistas e em outros meios audiovisuais a fim de contar  detalhes da história do ritmo que hoje é conhecido como forró, a representação máxima da cultura nordestina. As quatro centenas e meia de páginas deixam claro que não se trata de um compêndio precário, mas de um relato que congrega as histórias dos principais nomes dos ritmos nordestinos. Na verdade, os autores planejaram a obra de modo a dar voz aos personagens, em vez de falar por eles. Isso torna-se notório desde a introdução, feita a partir de trechos de um relatório do folclorista potiguar Câmara Cascudo, passando por transcrições de diálogos tal e qual ocorreram durante todo o livro, até o final, um excerto de um depoimento de Luiz Gonzaga. Nem mesmo ao registrar a história de bandas que não gozam de unanimidade entre os admiradores do gênero musical – como o forró eletrônico e o universitário – os autores exprimem opinião própria. Elogios ou críticas ficam a cargo dos artistas veteranos, representantes mais tradicionais do ritmo.

O livro adota também uma postura inusitada (e importante) para livros do gênero: a atenção dispensada aos compositores. Normalmente compositores são figuras relegadas a segundo plano, trazidos ao palco apenas em duas situações: quando também cumprem o expediente de intérpretes ou quando produzem prolificamente, alcançando centenas de composições. Na história do forró, os autores demostram que o compositor é tão importante quanto o artista, pois há que ser um indivíduo que congregue a vivência do sertão e que tenha traquejo com as palavras – nem sempre fazendo a melodia, uma vez que, nas parcerias, ela às vezes era contribuição do sanfoneiro. O livro revela que muitos foram os casos de compositores que viraram intérpretes de suas próprias canções, e cantores alçados ao sucesso ao gravar um determinado compositor.

Mas o grande mérito do livro é mostrar os cruzamentos das histórias de cada artista, construindo a narrativa segundo a ordem dos acontecimentos – além de fornecer informações geográficas, históricas, políticas, sociais e econômicas de determinada região, quando necessário. Desse modo, registram-se as amizades, intrigas, admirações, medos, desejos, sonhos e decepções desses artistas que só eram fortes juntos. Nossos representantes musicais, assemelhados pela dureza da vida severina, nunca deixaram de ajudar os seus, seja apresentando-os a empresários, introduzindo-os no meio musical, gravando suas composições ou dando guarida aos que se mudaram para o Rio de Janeiro – passagem obrigatória para o artista que desejasse ter projeção nacional. Sabendo-se fracos e menosprezados pela população do sul do país, os músicos migrantes do nordeste mantiveram-se unidos e próximos a seus ouvintes mais cativos: os trabalhadores conterrâneos, que procuravam matar um pouco a saudade da terra através dos encontros onde essa nova música era sempre apreciada. Quando a classe média começou a perder o interesse no forró, foi esse público, juntamente com os que ficaram no nordeste, que sustentaram – e ainda sustentam – os artistas da terra.

Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro, Marinês, Abdias, Dominguinhos, Trio Nordestino, Trio Mossoró, Genival Lacerda, Antonio Barros. Esses são alguns dos nomes que, para o leitor iniciado no forró, revelarão o que ficou oculto por trás das gravações. Para os alheios ao ritmo, ganharão vida e personalidade a partir dos relatos presentes no livro. O Fole Roncou – Uma História do Forró é um livro imprescindível para os amantes desse gênero musical, indispensável para os fãs de música brasileira e altamente recomendável para todos os envolvidos com música.



O fim do mundo

Não faz muito a humanidade ficou em polvorosa por haver chegado a época de mais um pressagiado fim do mundo. Desta feita foi a vez da previsão inca. Não se concretizou. Bem, ao menos, não da forma como foi anunciada. Digo, crida, uma vez que a profecia não entrava em detalhes.

Porém, se pensarmos bem, podemos verificar que o fim do mundo, anunciado ou não, está ocorrendo agora. Sim, ele já chegou. Estamos vivendo a era do fim do mundo. Ele está morrendo aos poucos. Já vinha sangrando, mas agora o padecimento se intensificou. Podemos notar isso a partir de alguns fatos. Mais especificamente no campo das artes. Elas são um bom indício de como anda a saúde do mundo.

A arte acompanha a humanidade desde a pré-história, como nos mostra o legado das pinturas rupestres e os rústicos instrumentos musicais da época, como as flautas feitas a partir de ossos. A arte sempre refletiu o estado de espírito e ânimo do artista, que, por sua vez, encontra-se imerso em um contexto social. Ou seja, a arte registra, mesmo que involuntariamente, o modus vivendi da sociedade na qual o artista está inserido. Por exemplo, as músicas já foram predominantemente ritualísticas, de guerra, religiosas, contestadoras, experimentais. As pinturas variaram entre representar o dia a dia dos ajuntamentos até desembocar na arte das ruas – demostrando que seu domínio encontra-se distribuído entre todos –, passando por momentos de ilogicidade revoltosa e busca da representação fidedigna do mundo. A literatura, por si só, pode ser considerada uma camaleoa. Até a fotografia, tão recente, já passou por fases. Porém, nada do que vimos hoje parece ser algo que a posteridade – se houver alguma – irá lembrar saudosamente (os shows onde se tocam músicas antigas que marcaram a infância e juventude dos adultos não devem ultrapassar essa geração).
     
O mundo já foi um lugar mais difícil de se viver – e, do ponto de vista artístico, mais interessante. Passamos por guerras, sustentamos anseio por liberdade, tivemos que quebrar regras, idealizamos um futuro diferente. E lá estava a arte fazendo sua parte, cumprindo com seu dever, representando todos esses momentos – de maneira engajada ou nos bastidores, servindo ao homem simples e alheio dos grandes acontecimentos. Mas, feliz ou infelizmente, conseguimos transformar o mundo. O  muro caiu, as fronteiras se abriram, os idiomas se entenderam. A cultura do mundo se planificou. E agora? Que novo mundo é esse? É o mundo onde tudo é fácil, onde os modelos já estão todos prontos, onde até os diferentes são iguais. O mundo sem censuras, sem ameaças, sem interesse. O mundo que está tão focado na parte que se esquece do todo. Não há consequências, apenas o aqui e agora. Carpe diem e laissez-faire para todos. E de graça!

O habitante desse mundo que é atento já deve ter percebido: a arte prenuncia o fim do mundo. Se revisitarmos o passado, encontraremos ídolos na música. Eram intérpretes, bandas, músicos. Gente que fazia arte não para a efemeridade, mas para o eterno. Hoje, artistas medíocres são alçados à glória apenas por saudade do tempo em que havia titãs no meio musical. O que hoje surge, amanhã já desaparece. As músicas não têm essência alguma. Discorrem sobre frivolidades. São obscenas. São rasas. Hoje, o aparato eletrônico é mais importante que o artista, que, longe de ser refém, consiste em um verdadeiro cafetão digital. No filme Demolidor (com Sylvester Stallone e Wesley Snipes) há uma cena em que o personagem principal toma conhecimento de que as rádios do futuro tocam apenas jingles, e não mais músicas como hoje conhecemos. Ao que parece, era uma profecia que irá se cumprir.

A literatura também agoniza. Já está no último suspiro. Não se veem mais os literatos que impressionavam mesmo com um bilhete que fosse, artíficies que eram no uso das palavras. Suas estórias ainda hoje são recontadas em várias partes do mundo, à risca ou não. Tantas outras foram criadas a partir delas, usando-as como alicerce – dos mais sólidos. Hoje, porém, só se discorre sobre o óbvio. A prosa tem que ser escrita do modo como se fala, senão não entendem, esses leitores. As páginas têm que ser poucas e as letras, grandes. O título da obra não é importante. Se o autor é um produto do marketing, basta pôr seu nome na capa em letras garrafais e o título na lombada. Todo o mundo agora escreve. Há mesmo os que não escrevem, mas lançam livros. Alguém escreve por eles e eles apenas emprestam seus nomes. Acho que deveríamos pedir clemência aos imortais da literatura por isso.

Sim, é chegado o fim do mundo. Não há mais preocupações para nossos jovens. Todos só querem viver o hoje, como a cigarra de Esopo. Ideais não existem, moral não existe. Não defendo que toda música deve ter objetivo político (no sentido mais amplo da palavra), afinal, a música serve a todos e a música pela música é uma realidade antiga. Mas notamos um esvaziamento total de conteúdo no que é produzido atualmente, seja em território nacional ou estrangeiro. Os músicos são mais empreendedores do meio artístico que artistas propriamente ditos. As letras não convencem, as melodias não encantam. A magia se desfez. Aonde iremos parar? Talvez o mundo precise de um solavanco. Talvez precisemos de um despertar. Não queremos mais vidas perdidas em hecatombes, mas quem sabe um desafio novo não vem a calhar? A juventude já não é transviada: está perdida, no marasmo, ao largo da verve que acompanhou os artistas de outrora. Já não se fala mais de sentimentos, apenas de emoções. Resta-nos abraçar o retrô, idolatrar o vintage. É o que nos sobrou. E ter esperança – ou fé, dada a periclitante condição atual – de dias melhores. Bem-aventurados sejam os que tiverem lembranças, pois eles serão consolados. Bem-aventurados os que tiverem recordações, pois eles serão confortados. Senhor, perdoai-nos, pois não sabemos o que estamos fazendo.


quinta-feira, 9 de maio de 2013

Essência

Não quero uma coisa só
Quero de tudo um pouco
Não posso ser um apenas
Preciso é de ser muitos
Quero beber de muitas águas
e me saciar de vários frutos
Quero correr o mundo todo
e passar a outros mundos
Tenho que ser inconstante
Almejo ser dissonância
Uma vida só é pouco
para um querer tão grande

sexta-feira, 3 de maio de 2013

Não me representa?


Será que realmente os políticos brasileiros não representam nosso povo?


Estava lendo recentemente uma coluna gastronômica de um jornal quando, entre as tergiversações do colunista, ele falava das últimas ondas de protestos contra o atual líder da Comissão de Direitos Humanos da Câmara*. Esse colunista dizia que o slogan do protesto ("não me representa"), era desnecessário, uma vez que, dizia, "ninguém ali [no Congresso] nos representa".

Creio que o colunista cometeu um equívoco. Aliás, se desapercebeu de um fato: o Brasil é, desde há muito, um Estado democrático de direito. Desde o final da década de oitenta, a escolha de nossos representantes (sim, "representantes") se dá através do voto direto. Isso tem um significado muito simples: os políticos que estão no poder foram escolhidos por nós. Eu não votei em todos os que estão lá,  ninguém votou. Há mesmo os que julgo não deverem estar lá, mas estão. Eu sequer pude votar contra eles (não há essa opção em nosso sistema eleitoral – desconheço que algum país o tenha), mas certamente outras pessoas votaram a seu favor. Número suficiente para elegê-lo1. Ora, como pode tal político não representar ninguém?

Bem sei que há aqueles que estão no poder representando apenas uma pequena minoria – industriais, empreendedores do ramo agropecuário, etc. – mas isso não significa que não representam ninguém. E nesse quesito há tanto os que representam poderosos como os que defendem os desvalidos, como portadores de necessidades especiais, homossexuais, meio-ambiente, etc. Cada grupo tem direito a ser representado no Congresso, seja lá qual for sua causa. O ideal seria que todos os que estão no poder se voltassem para os problemas da sociedade, sejam eles compartilhados por muitos ou sofrido por poucos. Mas sabemos que isso é irreal.

No fundo, sabemos que o colunista, ao falar que não havia representantes do povo no Congresso (e nas demais casas públicas que abrigam os homens do poder), está se referindo à (aparente) discrepância entre os atos destes e os atos do povo. Epa! Mas a que povo ele se referiu? Talvez ele estivesse mesmo desconectado da realidade quando escreveu seu artigo e não tenha percebido que esse povo, ele incluso, é o brasileiro. Em sua visão pueril, nosso povo é honesto, lutador, puro, respeitador, promovedor do bem e da ordem. É bem fácil percebermos que esse definitivamente não é o retrato mais bem pintado de nossa gente.

Sim, há pessoas honestas, humildes e esforçadas por aqui, mas estão longe de ser o padrão. O padrão mesmo é o brasileiro espertinho, que sempre quer ter vantagem, que tem preguiça, que tem aversão ao esforço, que surrupia quando pode e disfarça sempre que possível. Essa é a visão em pequena escala. Quanto mais poder e meios eles dispõem, maior o efeito de seus atos. Gente simples faz mal aos vizinhos, mas grandes empresários conseguem demolir centenas de casebres, donos de vastas terras destroem a natureza intocada e industriais poluem e rios e envenenam os ares. E que dizer dos que detêm o poder das leis? Suas vontades serão imbatíveis. Mas – surpresa! – eles não passam do povo aumentado, ampliado através da investidura do cargo. Caso estivessem na massa, praticariam os pequenos delitos, assim como qualquer popular, alçado à condição de político, cuidaria em desfrutar impudicamente de todos os privilégios escusos e inerentes à sua posição.

Portanto, nobre colunista, sim, aqueles que estão ali nos representam, inequivocadamente.


* Deputado Marco Feliciano
1Com o atual sistema de voto por legenda, essa realidade deixa um pouco de ser verdade.