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quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Fim de ano


Fim de ano...
Fim de muita coisa
Fim de coisas planejadas
de coisas voluntárias
e de outras que nem começaram
Mas não é um fim que termina
É um fim que se transforma
Vira começo
Começo de muita coisa
Coisas que faremos
coisas que finalmente faremos
e outras que ficarão apenas na agenda
esperando o próximo ano
Mas o viver, por essa ocasião não termina
É contínuo
Ininterruptível até o final definitivo
Não entra na agenda
Não como um item
mas como as várias partes que o compõem
Era uma vez um ano
Será outra vez um novo
Que findem os maus sentimentos
e recrusdeçam os bons
Que nasçam, se for o caso
Façamo-lo diferente
Não necessariamente melhor
porque o destino é inexorável
Mas vivamos
Terminemos
E (re)comecemos

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Um Novo Sentido pro Natal

A data é bem conhecida de todos: gente na rua, viagens, presentes, um velhinho estrangeiro e a neve que nós não temos. A cidade, armada de luzes e enfeites, cuida em anunciar a época aos desavisados. É Natal!

Natal... O que significa mesmo? Com algum esforço, lembra-se de um menino que nasceu (faz tempo) bem longe. Difícil lembrar. Bate um sino e nos vem o nome Belém. Pronto! Obrigação cumprida, vamos às comemorações. De quê? Quem era o menino? Ora! Isso já não importa! Comamos e bebamos, companheiros! (lembro que antes dizia-se irmãos).

Diminuído o Natal, ficamos com o Ano-novo. Novo tudo. Compra-se novo, fala-se de novo, pinta-se de novo. E tão pouco dura o novo. Vem a velhice que tudo acaba e toma o carro, a casa, as roupas e até os hábitos. Velho tudo outra vez.

É por esse tempo que descemos aos porões, subimos aos sótãos, pegamos as caixas, empoeiradas, e tiramos dela a árvore, a estrela, as guirlandas, anjos e contas de vidro. Espana-se, endireita-se, põe-se tudo em ordem. Ao final, o que resta é guardar tudo. Desfaz-se o presépio, desmonta-se a árvore. É também quando muitos aproveitam o momento para ir a seu depósito, buscam o sorriso guardado, desembrulham a boa-vontade, espanam a solidariedade, todos empoeirados. Guardam na caixa o mau-humor, a vingança e a ranzinzice, para pegá-los dali a alguns dias.

Então viram as festas de fim-de-ano uma grande deixa: um momento raro onde as pessoas apresentam o melhor de si e pode-se praticar valores esquecidos, como o perdão, o dar-se incondicional, o companheirimo. Se foi esquecido o princípio do Natal, se a passagem de ano virou sinônimo de enovecer tudo, fiquemos com o que há de bom nessa época. Praticar a amizade, trocar abraços, olhar o outro e vermos a nós mesmos. Agradecer (a quem?), ao menos no fim do ano, as coisas que vivemos. Mesmo aquelas que não vemos de tanto olhar. Lembrar a religião e praticar a tolerância tão em falta.

Se isso é Natal, por que esperar todo um ano? Celebremos todos os dias. Pensemos em prolongar os bons sentimentos e ações por mais tempo, desvincular boas emoções de objetos empoeirados, tentar mudar o mundo com a pouca força que cada um tem, mas muita se somada. Comamos e bebamos, sim, mas não deitemos no fundo da caixa o amor, a fé e a esperança. Vamos deixá-los para sempre pendurados na árvore da vida.

sábado, 15 de dezembro de 2012

Maceió


Maceió minha
Minha Maceió

Tens história
Tens personagens
Tens lembranças
e sentes dores

Maceió minha
Minha Maceió

Um dia estive aí
e me sentia infeliz
Hoje estou longe
e me sinto mais infeliz ainda

Maceió minha
Minha Maceió

Porque é preciso ir longe para ver
Perder para sentir
Ter pouco para valorizar
e ter saudade para lembrar

Maceió minha
Minha Maceió

Tens sofrido tanto
nas mãos de homens que não te querem bem
Querem sepultar teu brilho
Querem que se esqueçam quem és

Maceió minha
Minha Maceió

Mas não te preocupes
Tens filhos valentes
que hão de proclamar teu nome
em lugares que desconheces

Maceió minha
Minha Maceió

Bendita seja a cor de teus mares
Benditas sejam tuas fontes de águas
Rende à mãe-natureza graças
pelas dádivas que dela recebeste

Maceió minha
Minha Maceió

Tua música é bela
Tuas festas são vivas
Tuas delícias são ricas
e teus sabores são muitos

Maceió minha
Minha Maceió

Sou exilado de teu chão
Sou privado de ti
São as lembranças que me sustém
e a saudade que me mata

Maceió minha
Minha Maceió

domingo, 9 de dezembro de 2012

Sugestão de leitura




Título: A Língua de Eulália
Autor: Marcos Bagno
Editora: Editora Contexto
ISBN: 978-85-7244-397-5








– Para dizer a verdade – prossegue Irene –, a Eulália é um poço sem fundo de conhecimento e sabedoria. Todo dia aprendo uma coisa nova com ela. Só de remédios caseiros, feitos com ervas medicinais, dava para encher uma enciclopédia. E como conselheira para momentos de angústia e depressão não conheço melhor psicólogo do que ela.

– Pode até ser – comenta Emília enquanto as quatro se sentam num grande banco de madeira sob um caramanchão. – Mas ela fala tudo errado. Isso para mim estraga qualquer sabedoria.

– Eu tive de me segurar para nao rir quando ela disse aquelas coisas na mesa – acrescenta Sílvia.

– Que coisas? – quer saber Vera.

– Ah, sei lá... agora não me lembro – responde Sílvia.

– Eu me lembro – adianta-se Emília. – Ela disse “os probrema”, “os fósfro”, “môio ingrês”...

– É mesmo – confirma Sílvia –, e a mais engraçada foi: “percurá os hôme”...

Sílvia ri, e Emília a imita.

Irene fica séria por alguns instantes. De repente, vira-se para as duas moças e diz:

Or tu chi se', che vuoi sedere a scranna / Per giudicar da lungi mille miglia, / com la veduta corta d' una spanna?

Sílvia, Emília e Vera, tomadas de surpresa, ficam mudas.

E então? Não querem rir também do que eu disse, como riram das coisas que a Eulália falou?

Mas você falou em italiano diz Vera.

Se era italiano, por que devíamos rir? Eu não posso achar graça naquilo que não entendo diz Emília.

E o que é que você fala? continua Irene.

Eu falo português diz Emília, já intrigada.

E o que é o italiano para alguém que fala português? quer saber Irene.

As moças param um instante para pensar. É Sílvia quem responde:

É outra língua.

Uma língua diferente completa Vera.

Muito bem diz Irene. Vocês não entenderam o verso de Dante que eu citei há pouco porque era italiano. Mas e se eu disser assim: “No mundo non me sei parelha, mentre me for' como me vay, ca já moiro por vos e ay!”?

Esse quase dá para entender, afinal é espanhol diz Sílvia.

Não senhora corrige irene. É português.

Português?! espanta-se Emília.

Português, sim, só que do século XII, Idade Média explica Irene. E que tal alguma coisa assim: “Estou-me nas tintas se não te apetece uma bola de Berlim”?

Vai me dizer que isso também é português? duvida Sílvia.

Claro que é, é português falado em Portugal. Significa: “Estou pouco ligando se você não gosta de comer sonho”.

Vera impacienta-se:

Tia, aonde é que você quer chegar?

Vocês não entenderam o Dante porque o italiano é diferente do português. Vocês não entenderam o português do século XII porque ele é diferente do português de hoje. E não entenderam o português de Portugal porque é diferente do português do Brasil.

E o que tem isso a ver com a fala errada da Eulália? pergunta Emília.

A fala da Eulália não é errada: é diferente. É o português de uma classe social diferente da nossa, só isso explica Irene.

Para mim é errado diz Emília.

É errado dentro das regras da gramática que se aplicam ao português que você fala diz Irene. Mas na variedade não-padrão falada pela Eulália essas regras não funcionam.

(…)

Antes eu quero saber o que foi aquilo que você disse em italiano...

Irene sorri:

São uns versos da Divina Comédia, de Dante. A tradução é difícil, mas significam alguma coisa como: “quem você, tão presunçoso, pensa que é para julgar de coisas tão elevadas com a curta visão de que dispõe?

domingo, 2 de dezembro de 2012

Nomes

Nossos nomes são nossa marca registrada. No entanto, parece injusto que o recebamos de outras pessoas, por motivos alheios aos nossos.



– Pois não, senhor Carlos, em que posso ajudá-lo?
– Tenha uma boa tarde, senhora Marisa, volte sempre!

Dizem as boas regras de convivência que a maior gentileza que se pode fazer com outra pessoa é chamá-la por seu nome – por isso os operadores de telemarketing e atendentes de loja são orientados a perguntar nossos nomes ao iniciar o atendimento. A pessoa sente-se especial, individualizada, única. Mas, a julgar pela extensa quantidade de nomes pouco convencionais – e pouco queridos – que por aí estão, essa regra é rebaixada de axioma (algo que não necessita de comprovação) para teorema (algo que deve ser provado como verdade).

Nossos nomes constituem um dos fardos mais injustos da atualidade. Eles nos são dados à nossa total revelia. Não opinamos, não tomamos parte, apenas o recebemos e não há nada a fazer que não aceitá-lo – há aqueles que o mudam, mas não sem complicações e dores de cabeça. Embora alguns argumentem que queriam ter pais diferentes, esse é um desejo impossível, uma vez que, com pelo menos um dos pais sendo diferente, a pessoa já não seria a mesma. No entanto, ter um nome diferente é um desejo totalmente plausível. A questão é que os pais não têm como saber se os filhos aprovarão o nome que eles escolheram.

Esse é um problema de muitos aspectos. Há diversas maneiras pelas quais os pais escolhem nomes para seus filhos. Alguns usam os nomes que estão na moda – por exemplo, o nome da protagonista da novela do momento –, outros, igualmente pouco criativos, reutilizam os nomes de parentes, como pais e avós. Há também os que, nesse caso, para que ambos os pais fiquem satisfeitos, dão ao rebento um nome que é a fusão de seus próprios nomes, gerando nomes estranhíssimos (imagine a fusão de Astrogenildo com Adamastora).

Mas há dois casos que, por sua excentricidade, constituem-se os piores. Um deles é quando os pais decidem fazer uma homenagem à custa dos filhos. Tudo bem os pais terem um time do coração, um ídolo dos esportes, um cantor preferido, um ator que admiram ou um escritor de quem gostam muito – às vezes, até um amigo se presta a esse fim. A pergunta é: o que seus filhos têm a ver com isso? Mas os pais, no calor do momento, não consideram que aquela criança, tão pequena e inerte, um dia terá seus próprios gostos e poderá discordar radicalmente da opinião de seus progenitores. Pior ainda se forem nomes ligados à religião. O rebento poderá tornar-se um descrente, um apóstata e, além de lamentar o nome que lhe perseguirá pelo resto da vida, ao mesmo tempo maculará a crença de seus pais com suas atitudes.

O segundo pior caso é quando os pais enfadam-se de procurar bons nomes e consideram que seria melhor criar nomes novos – um arroubo de autoconfiança e originalidade. Daí surgem nomes tão estranhos quanto divertidos – ao menos para os espectadores. São nomes de objetos, plantas, animais; termos os mais diversos. Há inclusive os que são formados por outros nomes ou mesmo frases escritos de trás pra frente. Não há limites quando se trata de pais empenhados em dar nomes únicos aos filhos.

Claro que sempre há a possibilidade de os pais terem escolhido um nome apropriado para o filho, mas esse nome pode assumir um significado depreciativo com o tempo. Qualquer nome está sujeito a isso. Sempre pode surgir um personagem na TV ou em livros – coisa rara, já que poucas pessoas leem hoje – e condicionar um nome a ele, afetando todos os portadores daquele nome. Não há muito o que fazer quanto a isso...

Talvez uma possibilidade de libertação para os filhos fosse receber nomes temporários dos pais, os quais poderiam alterar, caso desejassem, ao atingir uma determinada idade. Só teriam que lidar por um bom tempo com os apelidos baseados no nome antigo, além de ser inevitável os chamamentos do tipo “ex-fulano”. “– Ah, você que se chamava sicrano? Pode me chamar de João, mas todos me chamam de ex-beltrano”.

A escolha do nome para o filho é um desafio e uma responsabilidade. Por mais tempo que se gaste escolhendo, por mais considerações que tenham sido feitas, nada garantirá a simpatia da criança por seu nome. Ela poderá preferir outro qualquer, ainda que seja um tecnicamente pior. Se gostar, então todos viverão felizes para sempre, mas caso contrário, resta conviver com um apelido para substituir o nome, com o bullying, com o uso de apenas um nome (para os que têm nomes compostos), inventar um pseudônimo, esperar um redentor homônimo ou simplesmente afeiçoar-se a ele.