Nossos nomes são nossa marca registrada. No entanto, parece injusto que o recebamos de outras pessoas, por motivos alheios aos nossos.
– Pois não, senhor Carlos, em que
posso ajudá-lo?
– Tenha uma boa tarde, senhora
Marisa, volte sempre!
Dizem as boas regras de convivência
que a maior gentileza que se pode fazer com outra pessoa é chamá-la
por seu nome – por isso os operadores de telemarketing e atendentes
de loja são orientados a perguntar nossos nomes ao iniciar o
atendimento. A pessoa sente-se especial, individualizada, única.
Mas, a julgar pela extensa quantidade de nomes pouco convencionais –
e pouco queridos – que por aí estão, essa regra é rebaixada de
axioma (algo que não necessita de comprovação) para teorema (algo
que deve ser provado como verdade).
Nossos nomes constituem um dos fardos
mais injustos da atualidade. Eles nos são dados à nossa total revelia. Não opinamos,
não tomamos parte, apenas o recebemos e não há nada a fazer que
não aceitá-lo – há aqueles que o mudam, mas não sem
complicações e dores de cabeça. Embora alguns argumentem que
queriam ter pais diferentes, esse é um desejo impossível, uma vez
que, com pelo menos um dos pais sendo diferente, a pessoa já não
seria a mesma. No entanto, ter um nome diferente é um desejo
totalmente plausível. A questão é que os pais não têm como saber
se os filhos aprovarão o nome que eles escolheram.
Esse é um problema de muitos
aspectos. Há diversas maneiras pelas quais os pais escolhem nomes
para seus filhos. Alguns usam os nomes que estão na moda – por
exemplo, o nome da protagonista da novela do momento –, outros,
igualmente pouco criativos, reutilizam os nomes de parentes, como
pais e avós. Há também os que, nesse caso, para que ambos os pais
fiquem satisfeitos, dão ao rebento um nome que é a fusão de seus
próprios nomes, gerando nomes estranhíssimos (imagine a fusão de
Astrogenildo com Adamastora).
Mas há dois casos que, por sua
excentricidade, constituem-se os piores. Um deles é quando os pais
decidem fazer uma homenagem à custa dos filhos. Tudo bem os pais
terem um time do coração, um ídolo dos esportes, um cantor
preferido, um ator que admiram ou um escritor de quem gostam muito –
às vezes, até um amigo se presta a esse fim. A pergunta é: o que
seus filhos têm a ver com isso? Mas os pais, no calor do momento,
não consideram que aquela criança, tão pequena e inerte, um dia
terá seus próprios gostos e poderá discordar radicalmente da
opinião de seus progenitores. Pior ainda se forem nomes ligados à
religião. O rebento poderá tornar-se um descrente, um apóstata e,
além de lamentar o nome que lhe perseguirá pelo resto da vida, ao
mesmo tempo maculará a crença de seus pais com suas atitudes.
O segundo pior caso é quando os pais
enfadam-se de procurar bons nomes e consideram que seria melhor criar
nomes novos – um arroubo de autoconfiança e originalidade. Daí
surgem nomes tão estranhos quanto divertidos – ao menos para os
espectadores. São nomes de objetos, plantas, animais; termos os mais
diversos. Há inclusive os que são formados por outros nomes ou
mesmo frases escritos de trás pra frente. Não há limites quando se
trata de pais empenhados em dar nomes únicos aos filhos.
Claro que sempre há a possibilidade
de os pais terem escolhido um nome apropriado para o filho, mas esse
nome pode assumir um significado depreciativo com o tempo. Qualquer
nome está sujeito a isso. Sempre pode surgir um personagem na TV ou
em livros – coisa rara, já que poucas pessoas leem hoje – e
condicionar um nome a ele, afetando todos os portadores daquele nome.
Não há muito o que fazer quanto a isso...
Talvez uma possibilidade de libertação
para os filhos fosse receber nomes temporários dos pais, os quais
poderiam alterar, caso desejassem, ao atingir uma determinada idade.
Só teriam que lidar por um bom tempo com os apelidos baseados no
nome antigo, além de ser inevitável os chamamentos do tipo
“ex-fulano”. “– Ah, você que se chamava sicrano? Pode me
chamar de João, mas todos me chamam de ex-beltrano”.
A escolha do nome para o filho é um
desafio e uma responsabilidade. Por mais tempo que se gaste
escolhendo, por mais considerações que tenham sido feitas, nada
garantirá a simpatia da criança por seu nome. Ela poderá preferir
outro qualquer, ainda que seja um tecnicamente pior. Se gostar, então
todos viverão felizes para sempre, mas caso contrário, resta
conviver com um apelido para substituir o nome, com o bullying, com o
uso de apenas um nome (para os que têm nomes compostos), inventar um pseudônimo, esperar um
redentor homônimo ou simplesmente afeiçoar-se a ele.