Título: Ciência Picareta
Autor: Ben Goldacre
Editora: Civilização Brasileira
ISBN: 978-85-200-1063-1
A ciência é uma das poucas
unanimidades que existe – a despeito de sua rivalidade com a
religião. Quer validar uma teoria? Investigue-a através dos métodos
científicos. Quer chancelar um argumento? Cite artigos e
experimentos científicos que o corroborem. Quer combater o que quer
que seja? Recorra a um cientista para auxiliá-lo. Mas o fato é que
temos uma visão pueril desse universo, que nos chega em fragmentos –
através de citações em revistas – ou caricaturas – através de
produções de entretenimento. Mas o fato, que poucos sabem, é que a
ciência é feita por pessoas tão humanas quanto qualquer um de nós,
com falhas, defeitos, visões excêntricas de mundo, ganância,
orgulho, imperícia, incompetência, podendo gerar, através de seus
estudos, resultados questionáveis. Por esse motivo, torna-se
importante selecionar o que é boa ciência e o que não é.
Para as pessoas comuns, sem intimidade
com o modus operandi da ciência, o livro Ciência
Picareta, de Ben Goldacre,
oferece um passeio pelos principais aspectos que devem ser analisados
ao nos defrontarmos com divulgações, na mídia, de novidades da
ciência – uma
leitura leve e agradável. O cidadão mais
perspicaz deve ter notado, nesses últimos anos, uma sucessão de
fatos contraditórios alardeados pela mídia de massa, alegando
tratarem-se de evidências
científicas. Bons
exemplos disso são o
café e o ovo, ora rechaçados pelos nutricionistas, ora celebrados
como benéficos. A propósito,
o ramo da nutrição (ou nutricionismo, em
tom pejorativo adotado no
livro) é fartamente
criticado por Goldacre, uma vez que na Inglaterra, onde vive, essa
não é uma profissão regulamentada, o que permite surgir todo tipo
de charlatão reivindicando para si esse título. A
mídia é também especialmente atacada pelo autor, pois é, segundo
ele, a principal responsável pela má divulgação da ciência entre
o público leigo.
Mas
não apenas de vilões se constitui
o livro. Ele apresenta os
principais métodos científicos de pesquisa e os critérios
frequentemente utilizados
para avaliar resultados e
determinar se um dado estudo é válido ou não. Conceitos
de pesquisa usando
caso-controle,
estudo de grupo, duplo-cego, revisão por pares, entre outros, são
ilustrados com casos reais, destrinchados nos mínimos detalhes pelo
autor – que
também é professor universitário de métodos de
pesquisa científica. Para
isso, não se furta a fornecer detalhes dos cientistas (ou
pseudo-cientistas) investigados por ele, como artigos já publicados
e universidades
onde estudou ou empresas para as quais já trabalhou. Ele
também fornece elementos que
por vezes comprometem resultados aparentemente promissores, como
redução à média,
formulação de hipótese antes da análise, falhas de seleção de
espaço amostral e método
estatístico, entre outros.
Goldacre
discorre sobre fatos divulgados constantemente por jornalistas e
aceitos por todos como verdades comprovadas, mas que na verdade não
passam de estudos controversos ou exagero da mídia objetivando
produzir
destaques
para as capas de seus periódicos. É o caso da vitamina C como
cura da
gripe, da ingestão de antioxidantes no combate aos radicais livres,
da reposição hormonal, da
ingestão de suplementos vitamínicos
e da homeopatia – outro tema
criticado
durante todo o livro. Casos
mais graves, como a afirmação de que foi a mídia não-especializada
que descobriu e deu conhecimento ao fato da má formação gênica
produzida pela ingestão da substância talidomida por gestantes, a
suspensão de remédios anti-HIV na África por autoridades
influenciadas pela ideia de que a medicação é que os tornava
doentes, e a associação entre a vacina tríplice-viral e casos de
autismo também são abordadas no livro.
A
principal contribuição do livro é mostrar que cientistas
nem sempre são pessoas isentas, principalmente se financiados por
instituições farmacêuticas ávidas por vender seus produtos, ou
recrutados pela mídia para produzir alegações que suportem
manchetes bombásticas. É
essa a fórmula que produz muito do que lemos em revistas leigas de
ciência, infelizmente.
Mas o leitor atento de Ciência Picareta perceberá com outros olhos
os supostos furos jornalísticos que se propõem a divulgar uma mais
nova descoberta científica, estando
imunizado contra bobagens sem sentido.
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