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quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Os brasileiros e a Música

A relação dos brasileiros com a música é controversa. Bastante. Somos conhecidos como um país musical, mas, contraditoriamente, não temos artistas internacionais ou músicas conhecidas no exterior (salvo raríssimas exceções). E, mesmo quando ocorrem, são pontuais e passageiros. Costumo dizer que os brasileiros não fazem música; eles a usam. Usam-na para protestar, usam-na para divulgar um modo de vida, apenas animar festas ou conseguir parceiros sexuais.
 
Há três conceitos fundamentais em música: melodia, harmonia e ritmo. Podemos ouvir música de modo distinto tomando como base cada um desses elementos constitutivos. Podemos nos deixar levar pela pulsação se atentarmos principalmente ao ritmo. Podemos nos guiar por sentimentos diversos se nos ligarmos à melodia. Ou podemos apreciar a complexidade da música se ouvirmos conscientemente a harmonia apresentada. No Brasil, o público apresenta bastante dificuldade em ouvir da última forma e não se decide sobre a segunda, além de exagerar na primeira.
 
Por aqui predomina a noção de que uma música é bonita se tem uma letra bonita, independentemente de se quem a executa é um cantor medíocre ou músico sofrível. Além de ser uma das maiores bobagens musicais já proferidas, essa ideia não resiste aos argumentos mais simples. Primeiro, se você tem que entender a letra para gostar de uma música, por que então as músicas estrangeiras fazem mais sucesso do que as nacionais, quando é sabido que os brasileiros não sabem inglês? Em segundo lugar, se uma música tem que ter letra para ser apreciada, que dizer das músicas instrumentais? Devemos jogar todas fora? Banir a música clássica? Por último, se a letra é tão importante assim, qual o motivo de as canções de maior audiência serem justamente aquelas desprovidas de conteúdo, que se valem de cacofonias, letras vazias ou sem sentido e obscenidades?
 
É comum se ver por aí pessoas que se esforçam “contra sua natureza” para ouvir músicas mais elaboradas, mas, na primeira oportunidade, rendem-se à sua “condição normal”, ouvindo o pior que existe em nossa produção musical. Os estilos puramente rítmicos são os preferidos, por não exigirem esforço mental algum. No máximo, uma letra que fala de amenidades, embora a maioria atualmente apenas banaliza o sexo.
 
Não defendo que as canções tenham que ter uma letra elaborada. A propósito, letras são a última coisa que analiso quando ouço uma música. Naturalmente, uma boa letra dá um brilho especial à música, mas o universo musical é bastante rico para necessitar que se lhe empreste sentido através de letras. A mágica dos sons fala por si mesma.
 
Com alguma pesquisa e observação podemos encontrar estilos musicais desenvolvidos em nossa terra, mas é triste perceber que os últimos de que tenho notícia não passam de mercadoria sem valor, produto para massas. Obviamente, deve haver estilos os mais diversos, para cada situação e para cada segmento social (em sociedades que assim o exigem), afinal, a música serve a todos e todos têm direito a ela. Mas bom seria se a decisão do que ouvir fosse motivada por nosso arbítrio, e não por limitação intelectual.
 
Há ainda aqui aqueles que se gabam por se auto-afirmarem ecléticos, quando na verdade melhor seria classificá-los como pessoas sem critérios. Há uma diferença entre ouvir tudo e ouvir de tudo. Os verdadeiros ecléticos não são depósitos musicais que tudo aceitam sem a mínima avaliação. São antes pessoas capazes de se despir de pré-julgamentos e pressões externas pelo prazer de desfrutar a incrível gama musical que nos é oferecida.
 
Enquanto não entendermos que a Música (sim, com M maiúsculo) é uma arte belíssima, continuaremos à mercê da ignorância que faz progredir a multiplicação da pífia musicalidade que ora se nos aparece. Devemos ter mais respeito a essa arte, e não apenas usá-la para obter privilégios fúteis.

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