A venda da virgindade por parte de uma jovem pode até ser o ápice de uma sociedade onde sexo e dinheiro se complementam, mas está longe de ser a única manifestação disso.
Há alguns dias os noticiários
veicularam diversas matérias a respeito de uma jovem brasileira que
decidiu leiloar a virgindade por motivos controversos. O fato causou
alguma repercussão. Enquanto alguns deram de ombros por acreditarem
que ela tem a liberdade de fazer o que quiser com seu corpo, outros a
criticaram. Não cabe aqui fazer uma discussão moral ou ética a
respeito, mas é uma boa oportunidade para tomarmos tal caso como
mote para outra discussão.
Muitas mulheres se indignam com o fato
de que algumas delas utilizem seus corpos para auferir ganhos. Acham
um absurdo, algo sujo, inaceitável. Embora umas poucas façam
críticas com motivações invejosas – frustram-se por não terem a
coragem de seus alvos –, a verdade é que a maiora delas não
percebe que esse fato é apenas o cenário mais gritante da troca de
favores sexuais por pecúlio.
Muito da ideia de romance que
acreditamos ser verdade vem dos contos de fadas. Neles, as “heroínas”
são lindas e desfavorecidas socialmente. Sofrem agruras as mais
diversas até que são salvas por um príncipe que lhes dá tudo –
o qual nunca viram ou ouviram falar. Não fosse ele, a heroína
seguiria sua vida de sofrimento, infeliz para sempre. Não são
poucas as mulheres que carregam essa ideia de relacionamento. Crescem
na projeção de um dia encontrarem um homem perfeito que mudará seu
rumo, tornando esse encontro um divisor de águas em sua vida. Com
isso em mente, esquecem-se de viver suas vidas, preferindo a
reconfortante crença de que alguém aparecerá para suprir suas
necessidades. Com o advento das mulheres no mercado de trabalho, a
dependência financeira diminuiu, mas a emocional continua bem
presente mesmo em nossa época. Aceitam a idea de que o homem tem a
obrigação de lhes prover tudo, mas em nenhum momento acenam com a
possibilidade de fornecerem uma contrapartida – limitam-se
basicamente ao sexo, não diferindo em nada das princesas dos contos
que só possuíam beleza. Isso abre precedentes para que o homem
busque outra tão logo a beleza acabe.
Enquanto algumas assumem a posição
de dependência de maneira quase ingênua, há mesmo aquelas que o
fazem escancaradamente: selecionam homens unicamente pelo quanto
ganham; ou procuram se casar com um estrangeiro cujo idioma não
conhecem apenas para ir morar em um país mais desenvolvido. Muitas
não trabalham e nem fazem menção disso. No máximo cursam uma
faculdade. Prestam-se ao papel de amuleto ou troféu do marido. Seria
natural, nesses casos de relacionamentos bastante desequilibrados,
concordar que o homem, uma vez que detém o poder financeiro, possa
tomar a maiora das decisões – mesmo deixar o relacionamento ao se
sentir atraído por pessoa mais interessante. Ora, quem não quer ser
tratado como mercadoria não deve se vender.
Esse último caso é abafado como
verdadeiro devido ao mito de que o amor é cego. De acordo com ele,
duas pessoas que nunca se viram na vida passam a se amar
instantaneamente no momento do primeiro olhar – ou antes mesmo de
saber que a outra pessoa existe. Não é preciso conhecer o outro,
admirá-lo, ser capaz de conversar com ele. O amor é suficiente
apenas devido à existência do outro. Não é necessário pensar
muito para perceber que esse tipo de relacionamento não é
sustentável. Um casal que decide se formar e viver sob a bênção
do amor deve entender que passarão a maior parte do tempo em
atividades comezinhas – decisões sobre qual lugar ir, contas a
pagar, etc. – e não em enlevadas contemplações românticas ou
memoráveis noites de sexo.
O que sustenta uma relação harmônica entre duas pessoas é o
respeito e admiração que cada um tem pelo outro, e não um capricho
do cosmos que liquida o intelecto e impele a pessoa para outra
qualquer, ainda que lhe custe uma vida de sofrimento.
A venda da virgindade por parte de uma
jovem pode até ser o ápice de uma sociedade onde sexo e dinheiro se
complementam, mas está longe de ser a única manifestação disso.
Umas mais discretas, outras com menos reservas; casos não faltam
onde as mulheres se submetem aos homens por benefícios outros que
não o caminhar junto rumo à uma convivência solidamente
fundamentada. Mas talvez a maior indignação dos críticos da
“virgem brasileira” seja o fato de que, daqui pra frente, vamos
nos defrontar com sua imagem estampada nos mais diversos lugares e
eventos. Isso ocorre devido ao esforço da mídia em utilizar a
imagem da moça, uma vez que tem a certeza de que há interesse por
parte da sociedade nisso. Enquanto por um lado atiramos pedras na
moça, por outro aplaudimos sua presença no palco. É a manifestação
clara da hipocrisia.
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