Os pais constituem uma das maiores fontes de influência na vida dos filhos. Pena que nem todos têm consciência disso
Há uma corrente filosófica bastante
comum que afirma que o homem é um produto do meio. O filósofo suíço
Jean-Jacques Rousseau acreditava que o homem é essencialmente bom,
mas a sociedade o corrompe – caso dos que se tornam maus.
Obviamente, o comportamento do ser humano não pode ser determinado
assim de modo tão cartesiano e por apenas um fator, mas por uma
intrincada relação de variáveis, em graus diferentes e influência
relativa às predisposições individuais. Acredito que o homem tem
uma inclinação para o mal – vide o fato de ser mais fácil para
as crianças aprenderem coisas ilícitas que construtivas, além de
haver mais mal que bem no mundo –, mas que sua conduta decorre de
dois fatores: sua índole e as pessoas que o influenciam. Dentre as
últimas, creio que os pais são os principais representantes, com
quem a criança passa os primeiros momentos de sua existência,
aprendendo coisas que levarão para o resto da vida. Essa afirmação
não é baseada em suposições ou teorias. O que me faz afirmar isso
é o exemplo que tive. Meus pais foram a grande influência de minha
vida e certamente sou o reflexo dos valores que me ensinaram.
Nasci e cresci em um dos bairros mais
violentos e pobres de uma das cidades mais violentas do mundo.
Estatisticamente, poderia não estar vivo, ou deveria viver à margem
da sociedade, ocupando uma posição social invisível.
Probabilisticamente, não deveria ter nível superior, ser cidadão
de bem, nem ter ascendido socialmente. Em meio a todos os fatores que
me impediram de seguir o destino comum às pessoas que conheci no meu
bairro, a educação que recebi de meus pais foi preponderante.
Quando falo em educação não me refiro a ensinamentos do tipo que
recebemos na escola (que, da forma como a escola os ministra, pouco
se aplicam à vida), mas aos preceitos que norteiam nosso modo de
viver como um todo. Meus pais eram pessoas simples, conservadoras,
praticamente sem instrução, tentando criar os filhos num meio onde
a facilidade para o mal, o crime e o vício estava à distância de
uma casa apenas. Conseguiram salvar os quatro filhos, e isso vale
mais que a maioria dos discursos de psicólogos modernos que não têm
filhos e creem poder dar conselhos a jovens pais.
Aprendi diversas coisas com meus pais,
direta ou indiretamente. Uma das mais importantes é que, mesmo sem
instrução formal, é possível ter bom-senso, ser justo, honesto e
responsável, além de possuir sabedoria. Os estudos nos auxiliam a
alcançar essas qualidades, mas não são o único caminho até elas,
tampouco garantem que todos que por ele sigam as adquiram. Não são
poucos os tiranos que ostentam títulos e diplomas, justamente por
não terem encontrado o caminho da ética através do conhecimento.
Aprendi também que animais sentem e
sofrem, portanto, não devemos maltratá-los. Mas sentem e sofrem
ainda mais os seres humanos que estão abandonados pelas ruas, com a
dignidade e a humanidade extintas. Devemos ser bons com os animais,
mas jamais devemos colocá-los em pedestais e tronos, como muitos
fazem hoje. Animais são animais e devem viver o mais próximo disso.
Oxalá a atenção e as somas de dinheiro gastas com animais
domésticos fosse revertida para minar a miséria do mundo.
Aprendi que, por mais encantadoras que
sejam, crianças são apenas isso: crianças. Elas devem ser
ensinadas que há autoridades – em geral, as pessoas mais velhas –
que devem ser obedecidas e ordens que devem ser seguidas, e não que
o controle de casa está condicionado a seus berros e esperneios. Sua
personalidade, em grande parte, começa a se formar cedo, e cabe aos
pais incutir-lhes o que se espera de pessoas de bem, vivendo em uma
sociedade. Claro que elas possuem o livre-arbítrio para decidirem
como viver suas vidas, mas os pais não podem se eximir da
responsabilidade que lhes compete.
Aprendi que todo trabalho é digno,
desde que honesto. Que a preguiça pode levar ao delito. Que só se
pode ter aquilo que for possível – a ostentação deve ser
repudiada. Que o importante em presentear é o ato em si, e não o
valor do presente. Que as pessoas devem andar por si só, e não
caminharem apoiadas nos outros. Que cada um deve ser responsável por
suas ações e resolver os problemas que criou. Que seja dada
liberdade para quem quer se afastar e acolhida para quem se achega.
Que devemos nos preocupar apenas com o que é importante, não dando
valor a acontecimentos insignificantes. Que quem se pauta pela
opinião alheia é tolo – devemos apoiar nossos próprios atos. Que
devemos nos afastar dos transgressores, mesmo que sejam de nossa
família. Que devemos ajudar quem nos procura, mas ao limite de nosso
alcance. Que devemos dar valor ao dinheiro que é suado, pois ninguém
nos dará nada de graça. Que favor se paga com favor e a união
dentro de casa é imprescindível. Aprendi que nossos atos têm
consequências com as quais temos que arcar. Que o justo e
trabalhador será recompensado por todo o seu esforço, ainda que
demore. Que quem está no direito da razão deve defender sua
posição, seja onde for e perante quem for. Que os ricos não são
melhores que os pobres pelo dinheiro que possuem – muitas vezes,
são mesmo piores.
Por fim, aprendi que deve-se fazer o
que é certo, e quem tem força de vontade alcança seus objetivos.
Foram esses os ensinamentos que recebi de meus pais e repasso, seja
através de minha conduta, seja exortando a outros. Talvez não sejam
os melhores ou mais adequados, mas me serviram muito bem. Alguns tive
que deixar para trás ou adaptá-los, dadas as mudanças do tempo e
da sociedade. Serei eternamente grato a meus pais por tudo quanto me
ensinaram. Muito me entristece ao ver pais que deixam os filhos à
deriva, sendo criados de qualquer modo, aprendendo coisas terríveis
com qualquer um que queira ensinar. Assim se está fadando a criança
a uma personalidade fracassada. O que esses pais não compreendem é
que colherão os frutos de sua irresponsabilidade, com dor e
lágrimas.
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