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domingo, 8 de setembro de 2013

Pais

Os pais constituem uma das maiores fontes de influência na vida dos filhos. Pena que nem todos têm consciência disso


Há uma corrente filosófica bastante comum que afirma que o homem é um produto do meio. O filósofo suíço Jean-Jacques Rousseau acreditava que o homem é essencialmente bom, mas a sociedade o corrompe – caso dos que se tornam maus. Obviamente, o comportamento do ser humano não pode ser determinado assim de modo tão cartesiano e por apenas um fator, mas por uma intrincada relação de variáveis, em graus diferentes e influência relativa às predisposições individuais. Acredito que o homem tem uma inclinação para o mal – vide o fato de ser mais fácil para as crianças aprenderem coisas ilícitas que construtivas, além de haver mais mal que bem no mundo –, mas que sua conduta decorre de dois fatores: sua índole e as pessoas que o influenciam. Dentre as últimas, creio que os pais são os principais representantes, com quem a criança passa os primeiros momentos de sua existência, aprendendo coisas que levarão para o resto da vida. Essa afirmação não é baseada em suposições ou teorias. O que me faz afirmar isso é o exemplo que tive. Meus pais foram a grande influência de minha vida e certamente sou o reflexo dos valores que me ensinaram. 

Nasci e cresci em um dos bairros mais violentos e pobres de uma das cidades mais violentas do mundo. Estatisticamente, poderia não estar vivo, ou deveria viver à margem da sociedade, ocupando uma posição social invisível. Probabilisticamente, não deveria ter nível superior, ser cidadão de bem, nem ter ascendido socialmente. Em meio a todos os fatores que me impediram de seguir o destino comum às pessoas que conheci no meu bairro, a educação que recebi de meus pais foi preponderante. Quando falo em educação não me refiro a ensinamentos do tipo que recebemos na escola (que, da forma como a escola os ministra, pouco se aplicam à vida), mas aos preceitos que norteiam nosso modo de viver como um todo. Meus pais eram pessoas simples, conservadoras, praticamente sem instrução, tentando criar os filhos num meio onde a facilidade para o mal, o crime e o vício estava à distância de uma casa apenas. Conseguiram salvar os quatro filhos, e isso vale mais que a maioria dos discursos de psicólogos modernos que não têm filhos e creem poder dar conselhos a jovens pais.

Aprendi diversas coisas com meus pais, direta ou indiretamente. Uma das mais importantes é que, mesmo sem instrução formal, é possível ter bom-senso, ser justo, honesto e responsável, além de possuir sabedoria. Os estudos nos auxiliam a alcançar essas qualidades, mas não são o único caminho até elas, tampouco garantem que todos que por ele sigam as adquiram. Não são poucos os tiranos que ostentam títulos e diplomas, justamente por não terem encontrado o caminho da ética através do conhecimento. 

Aprendi também que animais sentem e sofrem, portanto, não devemos maltratá-los. Mas sentem e sofrem ainda mais os seres humanos que estão abandonados pelas ruas, com a dignidade e a humanidade extintas. Devemos ser bons com os animais, mas jamais devemos colocá-los em pedestais e tronos, como muitos fazem hoje. Animais são animais e devem viver o mais próximo disso. Oxalá a atenção e as somas de dinheiro gastas com animais domésticos fosse revertida para minar a miséria do mundo.

Aprendi que, por mais encantadoras que sejam, crianças são apenas isso: crianças. Elas devem ser ensinadas que há autoridades – em geral, as pessoas mais velhas – que devem ser obedecidas e ordens que devem ser seguidas, e não que o controle de casa está condicionado a seus berros e esperneios. Sua personalidade, em grande parte, começa a se formar cedo, e cabe aos pais incutir-lhes o que se espera de pessoas de bem, vivendo em uma sociedade. Claro que elas possuem o livre-arbítrio para decidirem como viver suas vidas, mas os pais não podem se eximir da responsabilidade que lhes compete.

Aprendi que todo trabalho é digno, desde que honesto. Que a preguiça pode levar ao delito. Que só se pode ter aquilo que for possível – a ostentação deve ser repudiada. Que o importante em presentear é o ato em si, e não o valor do presente. Que as pessoas devem andar por si só, e não caminharem apoiadas nos outros. Que cada um deve ser responsável por suas ações e resolver os problemas que criou. Que seja dada liberdade para quem quer se afastar e acolhida para quem se achega. Que devemos nos preocupar apenas com o que é importante, não dando valor a acontecimentos insignificantes. Que quem se pauta pela opinião alheia é tolo – devemos apoiar nossos próprios atos. Que devemos nos afastar dos transgressores, mesmo que sejam de nossa família. Que devemos ajudar quem nos procura, mas ao limite de nosso alcance. Que devemos dar valor ao dinheiro que é suado, pois ninguém nos dará nada de graça. Que favor se paga com favor e a união dentro de casa é imprescindível. Aprendi que nossos atos têm consequências com as quais temos que arcar. Que o justo e trabalhador será recompensado por todo o seu esforço, ainda que demore. Que quem está no direito da razão deve defender sua posição, seja onde for e perante quem for. Que os ricos não são melhores que os pobres pelo dinheiro que possuem – muitas vezes, são mesmo piores.

Por fim, aprendi que deve-se fazer o que é certo, e quem tem força de vontade alcança seus objetivos. Foram esses os ensinamentos que recebi de meus pais e repasso, seja através de minha conduta, seja exortando a outros. Talvez não sejam os melhores ou mais adequados, mas me serviram muito bem. Alguns tive que deixar para trás ou adaptá-los, dadas as mudanças do tempo e da sociedade. Serei eternamente grato a meus pais por tudo quanto me ensinaram. Muito me entristece ao ver pais que deixam os filhos à deriva, sendo criados de qualquer modo, aprendendo coisas terríveis com qualquer um que queira ensinar. Assim se está fadando a criança a uma personalidade fracassada. O que esses pais não compreendem é que colherão os frutos de sua irresponsabilidade, com dor e lágrimas.

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