Havíamos
ingressado em uma nova empresa e estávamos nos submetendo a sessões de
atividades místico-transcendentais desenvolvidas por um desses RH modernos. Uma
dessas tarefas consistia em mantermos uma determinada quantidade de balões no
ar, à medida que o responsável ia retirando do grupo os menos engajados. Eu fui
um dos primeiros a ser removidos. Não dei o melhor de mim. Não tive espírito de
equipe. Estou fadado ao fracasso. Sou um péssimo ser humano, pois não tenho
ganas de enfrentar as adversidades da vida.
Nasci na
periferia de uma cidade violenta, que tornava-se cada vez mais violenta à
medida que eu ia crescendo, onde as pessoas mais cultas – menos de uma dezena –
eram aquelas que haviam “terminado os estudos”, ou seja, concluído o segundo
grau (na época se chamava assim). Aprendi a ler com minha mãe semianalfabeta e
meus irmãos que estavam na primeira e segunda séries. Entrei na escola com
aproximadamente nove anos de idade e, devido ao péssimo ensino público, tive
uma instrução deficiente em muitos pontos. Sem condições de arcar com o ensino
médio particular e sem querer continuar à mercê do ensino público estadual,
consegui, ao custo de muitas horas de estudo, ingressar na escola técnica
federal da cidade. Lá encontrei pessoas que vinham das mais renomadas escolas
da cidade. Era um curso ao mesmo tempo propedêutico (em teoria) e técnico –
informática. Cheguei sem saber de absolutamente nada, ao passo que os outros já
usavam computadores há tempos. Consegui me formar ao cabo de quatro anos, com
algum destaque. Sem dinheiro para custear cursos, aprendi praticamente sozinho
música, inglês e espanhol (ao menos ler e escrever). Desapontado com o mercado
de trabalho para técnicos em informática, estudei seis meses sem parar e passei
no vestibular, com uma pontuação situada na primeira centena de notas. Coloquei
como objetivo ser aprovado sem repor nenhuma nota na disciplina que mais
reprovava na universidade. Fui o único de minha turma que obteve sucesso. No
último ano do curso e no ano subsequente, fui aprovado em alguns concursos,
normalmente entre os primeiros colocados.
Mas, que
diabos, os balões... Os malditos balões revelavam ali minha natureza indolente.
Eu não tinha capacidade de enfrentar desafios, pois não me dispus a correr
atrás dos balões e espancá-los para mantê-los no ar. Enquanto os outros se
esfalfavam na atividade, eu, deliberadamente apoiando-me nos outros, fazia
corpo mole. Por isso fui removido da brincadeira. Fiquei de castigo, observando
os outros. Devia tê-los como exemplo. Com certeza sou uma pessoa horrível, e
estava patente ali que seria um péssimo colega de trabalho.
Quando as
sessões diárias, para meu alívio, enfim
terminaram, o relatório conclusivo não fazia menção à minha falha de caráter.
Lá constava que sou uma pessoa bastante concentrada (sendo assim, não entendo
porque não consigo passar horas fazendo uma mesma coisa) e deveria trabalhar
num quartinho, isolado. Por tratar-se de um relatório técnico, não era sugerido
ali a escuridão clareada por luz de velas nem a corrente amarrada ao pé. Meu
inconsciente deve ter se sublevado contra o método, pois, ao contrário do
prescrito, eu interagia com todas as pessoas da empresa, de todos os setores. Também
fiz a celebração de fim de ano, para um público de mais de cem pessoas, e
propus algumas ideias, até criativas, tanto para meu setor como a outro. Devo
procurar ajuda profissional? A causa de meu comportamento diferir do acusado na
minha ficha deve ser investigada.
Amigos do RH, que tal trabalharmos seriamente?
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