Título: Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil
Autor: Leandro Narloch
Editora: LeYa
ISBN: 978-85-62936-06-7
Entre os títulos que povoam as
estantes das livrarias brasileiras há vários que acrescentam muito pouco e
tantos que não tem nada para oferecer. Porém, há um que merece menção especial.
Trata-se do excelente livro Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil,
de Leandro Narloch. Longe de ser uma crítica vazia ou uma paródia revoltosa, o
livro reconta diversos fatos de nossa história, apoiado em registros
históricos, relatos de contemporâneos, livros, pesquisas acadêmicas e, também,
na lógica. Essa visita ao passado de nosso país vai de encontro ao que é
ensinado nas escolas. Há várias passagens do livro que poderiam ser registradas
aqui, mas há uma em especial que gostaria de compartilhar, pois é bastante
ilustrativa do teor do livro.
A natureza europeia fascinou os índiosA imagem mais divulgada do descobrimento do Brasil é aquela dos portugueses na praia, com as caravelas ao fundo, sendo recebidos por índios curiosos que brotam da floresta. Na verdade, houve um episódio que aconteceu antes: os índios subiram nas caravelas. Pero Vaz de Caminha, o repórter daquela viagem, relata em sua carta que, antes de toda a tripulação desembarcar na praia, dois índios foram recebidos “com muitos agrados e festa”. (…) Essa imagem sugere que, naquela tarde de abril de 1500, os índios também fizeram sua descoberta. A chegada dos europeus revelou a eles um universo de tecnologias, plantas, animais e modos de pensar.Até a chegada de franceses, portugueses e holandeses ao Brasil, os índios não conheciam a domesticação de animais, a escrita, a tecelagem, a arquitetura em pedra. Assentados sobre enormes jazidas, não tinham chegado à Idade do Ferro e nem mesmo à do Bronze. Armas e ferramentas eram feitas de galhos, madeira, barro ou pedra, e o fogo tinha um papel essencial em guerras e caçadas. Até conheciam a agricultura, mas em geral era uma agricultura rudimentar, pouco intensiva e restrita a roças de amendoim e mandioca. Dependendo da sorte na caça e na coleta, passavam por períodos de fome. Não desenvolveram tecnologias de transporte. Não conheciam a roda. A roda.(…) [Os índios] são na verdade herois do povoamento humano no fim do mundo, a América, o último continente da Terra a abrigar o homem. A chegada a um lugar tão distante custou-lhes o isolamento cultural.Entre 50 e 60 mil anos atrás, os ancestrais de índios e portugueses eram o mesmo grupo de caçadores e coletores. Tinham a mesma aparência, os mesmos costumes, a mesma língua rudimentar. (…) Durante a caminhada de centenas de gerações alguns deles perderam contato e se separaram. (…) Alguns caçadores nômades não devem ter percebido, mas já estavam na América, separados dos colegas asiáticos por um oceano.(…) O isolamento na América deixou os nativos americanos de fora da mistura cultural que marcou o convívio entre europeus, africanos e asiáticos. Esses povos entraram em contato uns com os outros já na Antiguidade. O choque de civilizações fez a tecnologia se espalhar. Por meio de guerras, conquistas ou mesmo pelo comércio, tecnologias e novos costumes passavam de cultura a cultura. Já os americanos viveram muito mais tempo sem novidades vindas de fora. Tiveram que se virar sozinhos em territórios despovoados, sem ter com quem trocar ou de quem copiar novas técnicas.De repente, porém, aconteceu um fato extraordinário. Apareceram no horizonte enormes ilhas de madeira, que eram na verdade canoas altas cheias de homens estranhos. Numa quarta-feira ensolarada do sul da Bahia, duas pontas da migração do homem pela Terra, que estavam separadas havia 50 mil anos, ficaram frente a frente. Os milênios de isolamento dos índios brasileiros tinham enfim acabado.(…) A história tradicional diz que os portugueses deram quinquilharias aos índios em troca de coisas muito mais valiosas, como pau-brasil e animais exóticos. Isso é achar que os índios eram completos idiotas. Aos seus olhos, nada poderia ser mais fascinante que a cultura e os objetos dos visitantes. Não eram só quinquilharias que os portugueses ofereciam, mas riquezas e costumes selecionados durante milênios de contato com civilizações da Europa, da Ásia e da África que os americanos, isolados por uma faixa de oceano de 4 mil quilômetros, não puderam conhecer. Comprar aqueles artefatos com papagaios ou pau-brasil era um ótimo negócio. Seria como trocar roupas velhas que ocupam espaço no armário por uma espada jedi de Guerra nas Estrelas.
Após ler esse livro, uma coisa nos
vem à mente: o que andam fazendo os professores de história? Durante décadas
temos sido ensinados de acordo com uma visão completamente retrógrada e
incoerente dos fatos. Foi preciso um jornalista (que, juntamente com os
engenheiros, se metem em todas as áreas do conhecimento) para levantar a mão e
dizer: “Epa! Será que isso foi assim mesmo?”. Esse fato coloca os cursos de
história – juntamente com outros, como administração – no banco dos réus: ou
são inúteis, ou devem ser reformulados do zero.
demais!
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