Muito me
espantei quando li pela primeira vez que Tim Maia foi um dos maiores soul-man
brasileiros (juntamente com um certo Cassiano). Suas músicas que eu conhecia
não lembravam em nada a música dos negros americanos que transformou a música
ocidental. Fiquei entusiasmado com a possibilidade de conhecer mais um trabalho
da música black no Brasil.
Passado
muito tempo (e aí eu já tinha conhecido muito do trabalho de Ed Motta1
– e adorado – e conhecido o tal Cassiano – e odiado), consegui com um amigo a
coleção completa de Tim Maia (incluindo os álbuns de seu período racional).
Comecei a ouvir. Um, outro, mais um. Álbum após álbum minha decepção só
aumentava. “Em que momento de sua vida esse homem cantou soul?”,
questionava eu. Não tive fôlego para concluir a discografia, mas cheguei bem
perto de terminar. Percebi bem poucos vestígios de que ele teve influência do
soul em sua carreira. Até o notável Michael Sullivan disse que foi apresentado
ao black através de Tim Maia. Bem, ao que tudo indica, ele realmente teve um
papel importante no cenário black do Brasil, só não sei como. Talvez como
divulgador, apenas. Sei que não foi através de suas canções. Não há como ter
sido. Até seu sobrinho, quando gravou com a Conexão Japeri aos dezesseis anos,
cantou mais soul do que ele.
Desde que eu
me entendo por gente eu gosto de soul, mesmo muito antes de saber o que
era. Quando ouvia alguém com aqueles
melismas e improvisos já começava a curtir. A certa altura de minha vida,
comecei a pesquisar sobre música negra, e li a respeito da formação, estilos,
execução, etc. No entanto, os conceitos não ficaram muito claros em minha
mente. Tentei ouvir Ray Charles na tentativa de que um dos pais do soul me
provasse os conceitos, mas ainda não foi com ele que os aprendi. Foi quando,
acidentalmente, ouvi por mera curiosidade um CD intitulado Pra Louvar, do grupo
paulistano Raiz Coral (e levei alguns meses até descobrir tanto o título como o
nome do grupo intérprete, pois o CD que tinha em mãos era uma cópia2).
Vencidos os primeiros momentos, aqueles em que o ouvido luta um pouco para
reconhecer o que não lhe é peculiar, quase caí pra trás. Ali estavam, como que
em formato de aula, todos os elementos do soul: improvisos (incríveis),
melismas (perfeitos), uma base instrumental genuína (maravilhosa), coro
responsivo e vocalização a três vozes, sem o baixo. Descobri que há um segmento
da música gospel3 brasileira que executa um black de
altíssima qualidade. Agora eu sei onde encontrar os verdadeiros soul-men
brasileiros. [Algumas amostras: Dê o seu melhor, A coroa, Jesus meu guia é, Minha pequena luz, Vem louvar, Caridade, Tocou-me, Bendito, Te louvo, Pra louvar]
E, voltando
ao assunto original do texto, pra ser bem sincero, acredito que Tim Maia apenas
fez sucesso devido a uma feliz confluência de fatores – os quais não tenho base
para julgar. Não vi nada de especial em seu trabalho para que fosse
entronizado entre os grandes nomes de nossa música. Talvez seja como o caso do
escritor americano Ernest Hemingway, com seu “O velho e o mar”. Deve ter sido
ótimo em sua língua original, na época em que foi escrito. Mas, visto hoje em
dia, não é muito superior a um livro bem escrito de alguma série adolescente.
Aos fãs de
Tim meu “sinto muito”, mas Raiz Coral e companhia são a excelência em soul
music em solo brasileiro.
1Ed Motta canta soul
2Essa cópia não era minha
3Tem gente que torce o nariz ao ouvir falar de
música gospel. Se você é um desses, veja esse vídeo.
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