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domingo, 19 de agosto de 2012

Crime e valores morais

O recente desmascaramento de grupos criminosos formados por jovens de classe média serve para desfazer o mito injusto de que apenas os pobres cometem crimes.

“Fica evidente que a motivação não é a desigualdade social, mas a falta de valores morais”. A declaração, proferida por uma socióloga, refere-se ao recente desbaratamento de gangues formadas por playboys cujo objetivo era financiar baladas com o fruto de assaltos e sequestros-relâmpago. Para quem vê de fora, essa frase parece uma iluminada revelação, mas para quem está inserido no meio, ela não passa de simples obviedade.

Os governos têm criado programas sociais a fim de promover a distribuição de renda, acreditando com isso afastar o risco da marginalidade nos lares atendidos por esses programas. Na lógica deles, pobreza, pura e simplesmente, gera bandidos. Embora esses fatores muitas vezes se superponham, essa relação não é direta. Criminosos são transgressores da ordem, e os motivos de agirem desse modo variam, mas algo comum a todos eles é a ausência de remorso por suas ações, motivada em grande parte pelo fato de acreditarem que o que praticam é aceitável sob seu ponto de vista. Uma pessoa que ignora a gravidade de seus atos, mesmo sabendo que são prejudiciais para os outros, é desprovida de qualquer grau de senso ético. Esse limite é regulado pelos princípios morais.

Caso a pobreza fosse fator determinante para a criminalidade, então todos os pobres praticariam crimes em algum grau. Mas isso está longe de ser verdade. Assim como é absolutamente falso que filhos de famílias abastadas passam longe da marginalidade. Com efeito, se tomarmos como base a Hierarquia de Necessidades de Maslow1, podemos afirmar que a não realização das necessidades fisiológicas básicas podem impelir alguém ao crime, mas apenas no sentido de satisfazer aquela necessidade. É o caso de alguém que rouba uma fruta na feira a fim de saciar a fome, não o havendo conseguido de outra maneira. Não é o caso de alguém que vira chefe de tráfico, o qual busca essencialmente poder e ostentação. Essa motivação pode estar presente tanto no dono de boca-de-fumo no morro quanto nos universitários de classe média que realizam sequestros.

Negar que há mais pobres no crime do que ricos seria absurdo. Como dito no início, a falta de valores morais favorece a criminalidade. Atualmente, a escassez desses valores ocorre tanto nas classes menos como nas mais favorecidas. No entanto, a falta de acesso à educação formal acaba por prejudicar de certa forma os menos abastados. Até pouco tempo atrás, eram raros os casos de assaltantes, época em que os pais, mesmo os de baixa renda, impunham rígidos valores morais aos filhos. Mas, com o advento de pais jovens e inexperientes aplicando conceitos psicológicos duvidosos de maneira distorcida, as crianças têm recebido um tipo de educação que deixa muito a desejar. Desconhecem limites e implicações de seus atos, forjados na “redoma de amor” dos pais modernos que lhes permitem tudo a fim de compensar a ausência devido ao trabalho. Em lares onde os pais podem financiar o luxo dos filhos, há menos risco de ele buscar recursos através do crime – embora o elevado padrão de vida de que desfrutam ou almejam possa incentivá-los a isso –, mas para aqueles que não podem, escolhem roubar como alternativa, culpando o sistema (que, sim, tem sua parcela de culpa) por seu desvio de conduta , quando na verdade lhes falta força de vontade para trabalhar arduamente.

Há muitos pobres honestos que, mesmo não possuindo recursos para frequentar determinados ambientes e adquirir itens de marcas conhecidas, esforçam-se por manter sua dignidade e caráter. Enquanto isso, há diversos filhinhos-de-papai que desconhecem os limites da ética e da convivência em sociedade, cuidando em utilizar da pior maneira possível o dinheiro dos pais e desperdiçar a oportunidade que tiveram na vida de serem pessoas de bem. Nascer em berço de ouro não é garantia de integridade. A parcela de educação proveniente dos pais ainda é o principal fator em jogo no que tange à formação de um bom cidadão.


1Modelo proposto pelo psicólogo americano Abraham Maslow que dispõe as necessidades humanas em forma de pirâmide, sendo a base formada pelas necessidades mais básicas (como fome e sede), seguindo em gradação até o topo, onde estão as necessidades referentes à realização pessoal (moralidade, criatividade, etc.). De acordo com Maslow, para se atingir um nível superior de satisfação, deve-se primeiro realizar as necessidades do(s) nível(is) anterior(es).

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