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sexta-feira, 13 de abril de 2012

Pedreiros tecnológicos


Li há poucos dias uma reportagem que falava dos novos talentos brasileiros na área tecnológica (mais especificamente, a computação). A matéria cita exemplos de brasileiros de sucesso que estão fazendo fortuna nessa área, dando a impressão de que essa agora é uma característica de nossos jovens. No entanto, tais casos de sucesso são exemplificados com universitários que foram estudar nas colleges americanas. Ora, traçar o perfil do jovem brasileiro através de uma minoria que tem condições de estudar fora é o mesmo que dizer que os brasileiros só vestem roupas de grife. Mas esse não é o principal aspecto que me chamou a atenção nessa reportagem.

Ao final da matéria há uma entrevista com alguns jovens talentos do ramo, com idades variando entre treze e vinte e nove anos. Em dado momento, os rapazes mais jovens (13 e 16 anos) afirmam que não pensam em fazer faculdade, pois não há necessidade, são dispensáveis. Servem apenas para networking. Para minha felicidade, um dos mais velhos “discorda totalmente” (em suas próprias palavras) desse pensamento. Essa declaração dos adolescentes exprime alguns pontos dignos de consideração.

Primeiro, como é possível falar de algo que não se sabe? Pessoas com treze e dezesseis anos apenas podem falar do que esperam ser quando crescer e não ficar dando pitaco sobre o que não tema mínima ideia do que seja. Por mais inteligentes e brilhantes que possam ser, existe uma coisa chamada experiência a qual é necessária em muitos aspectos da vida. É útil para reflexões e tomada de decisões. Apenas com o acúmulo de conhecimento variado é possível pensar de modo plural e solucionar determinados problemas. Por mais falhas que hajam em nossas universidades, ainda é lá que se produz o conhecimento acadêmico que gera patentes e inovações, tecnológicas ou não. É lá que se formam as imprescindíveis equipes multidisciplinares responsáveis por grandes revoluções. É lá que se cria consciência filosófica e científica, a qual perpassa todas as áreas de conhecimento. A teoria da computação (uma disciplina normalmente ministrada apenas nos cursos de Ciência da Computação) é um belo exemplo de cientificidade lógico-matemática que fundamenta a computação e levanta questionamentos a seu respeito. Obviamente esse conhecimento pode ser dispensado pela maioria dos profissionais do ramo, sem consequência para a execução da atividade. Mas é esse conhecimento que vai determinar se você possui uma visão de cima da área ou apenas um pedreiro tecnológico.

O segundo ponto de atenção é referente à ideia que as pessoas em geral (inclusive profissionais do ramo) tem da área. Há vários pensamentos errôneos: qualquer um acha que pode ler uma revistinha e se considerar um expert no assunto1; outros acreditam que um profissional deve saber tudo a respeito, esquecendo-se que em outras áreas, como a médica, por exemplo, há várias especialidades, e um médico nunca diagnostica sobre uma especialidade que não a sua; e há finalmente os que pensam que aqueles que trabalham com computação devem saber lidar com todos os dispositivos eletrônicos que existem. Retomando o exemplo do parágrafo anterior, há que se distinguir entre o projetista e o executor. Um engenheiro civil projeta estruturas, não levanta paredes. O engenheiro mecânico não tem que consertar máquinas. Para isso há o técnico. No caso da Computação, esse papel se confunde. Na maioria das vezes o arquiteto é o mesmo desenvolvedor, o projetista é o próprio implementador, contribuindo para enevoar o limite entre esses papeis.

Como técnico em informática e cientista da computação, segue meu recado para garotos que acham que desenvolver aplicativos para smartphones os confere autoridade para ditar rumos da computação: conheça a transformada de Fourier, entenda a importância do Teorema de Bayes, estude álgebra booleana, aprenda lógica de predicados, explore pilhas de protocolos de rede e transmissão de sinais em diversos meios, descubra o design por trás dos sistemas operacionais, tome conhecimento dos paradigmas de linguagens de programação e arquiteturas de desenvolvimento, passeie pelos vários temas da inteligência artificial, desvende os espaços vetoriais, dê uma boa olhada em matemática discreta, veja as transformações lineares, inteire-se sobre complexidade algorítmica e teoria da computabilidade, leia sobre Máquina de Turing e o modelo computacional de Von Neumann e diminua um pouco sua ignorância.



1Isso não invalida o fato de pessoas aprenderem computação sozinhas e tornarem-se muito boas no que fazem.

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