Li há algum tempo uma reportagem que
falava sobre timidez. Ela se referia à “vingança dos tímidos”,
numa alusão ao fato de os tímidos serem normalmente perseguidos e
desdenhados. Ora, mas quem disse que timidez é de todo mal? Ela,
juntamente com dias de chuva e água natural (não-gelada), fazem
parte de um grupo de coisas que as pessoas atacam como se fossem
anomalias da Inquisição.
Devemos dizer que há dois tipos de
timidez, basicamente. Uma é aguda, chegando a ser patológica. Essa
merece ser avaliada para um possível tratamento, pois normalmente
atrapalha o desempenho em funções normais da vida diária. Mas o
segundo tipo é antes uma característica de algumas pessoas do que
um defeito. Consiste na falta de capacidade de manifestar-se
publicamente em determinadas situações ou na dificuldade de
conversar com o sexo alheio. A melhor definição, ao menos para o
primeiro caso, talvez fosse “reservados”.
À primeira vista, quando se fala de
“falta de capacidade” nos vem logo à mente que isso é algo de
ruim. Mas, antes de tirarmos conclusões precipitadas, devemos
avaliar a situação. Na verdade, a pergunta que deve ser feita é:
será que os extrovertidos são tão bons assim?
A habilidade em expressar-se está
diretamente relacionada ao grau de segurança do falante. Se alguém
tem desenvoltura para dançar em público, falar abrobrinhas ou
caçoar de outras pessoas, é porque está seguro de que será
aprovado pela audiência – ou pelo fato de desprezá-la ao máximo.
Do mesmo modo, se alguém se sente à vontade para explanar um
trabalho de pesquisa a um grande público, ali não impera a timidez.
O temor de não ser aceito, o deslocamente social, é o que gera
desconfiança, incerteza e timidez, influenciando o nível de
“incapacidade” de se expressar perante outrem.
Tenho observado comportamentos ao
longo de anos. O que percebi é que os extrovertidos dos anos
escolares muitas vezes não conseguem se valer desse seu “dom”,
falhando em desafios que, ao menos para eles, deveriam ser simples,
como uma entrevista para admissão de emprego ou coisa parecida. Ali
não é a zona de conforto deles, que desperdiçaram muito tempo
apenas dedicando-se a entreter colegas em momentos de vadiagem. Ali
são reis, mas em situações que realmente importam na vida,
tornam-se cabisbaixos e impotentes como os tímidos que desprezavam.
Por outro lado, não são poucos os
rotulados tímidos que facilmente enveredam pelos caminhos da
ascensão e chegam a postos elevados em seus trabalhos. Isso se deve
ao fato de, longe dos holofotes, utilizarem seu tempo para estudar e
aprender com dedicação, o que lhes confere segurança na área em
que decidem atuar. Essa segurança permite que obtenham sucesso
quando for preciso expor suas habilidades. E até diminuir sua
timidez com isso (existe ex-tímido, mas ex-extrovertido desconheço).
Há apenas uma arena onde os tímidos
invariavelmente sofrem reveses. Esse é o campo do relacionamento
amoroso. Na cultura em que hoje vivemos, ganha quem se expõe. A
preferência feminina é pelos que falam em demasia – não
importando muito o quê. Esse aspecto acua o tímido, pois não há
como inferir o sucesso ou rejeição nesse quesito, uma vez que
depende muito mais da outra parte. Não é como uma disciplina que se
estuda, mas é antes um exercício de montagem realizado no escuro. O
que as mulheres deveriam atentar, porém, é que os extrovertidos são
dados a aventureiros, pois conquistam fácil o coração das moças e
seguem colecionando paixões como trofeus em prateleiras. Já os
tímidos, por serem normalmente mais sensíveis, valorizarão muito
mais o relacionamento que lhes custou a exposição a um possível
vexame. Constituem assim melhores amantes, oferecendo companheirismo
e atenção em maior intensidade (algo que muitas mulheres só
percebem como essencial após o primeiro divórcio).
Embora tímidos e extrovertidos nunca
se entendam completamente, um pouco de empatia por parte de ambos é
fundamental para que um aprenda com o outro a arte de tirar proveito
de cada temperamento.
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