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domingo, 10 de junho de 2012

Eufemismos

A atual onda de eufemismos não passa de mascaramento para destratos que permanecem intocados

Eufemismos sempre existiram. É uma interessante figura de linguagem. Amenizam o sentido de certos dizeres que de outro modo seriam inapropriados em determinada circunstância. Mas temos visto nos últimos anos uma explosão de eufemismos. Um verdadeiro abuso, na verdade. São eufemismos de todos os tipos, muitos deles inúteis, outros equivocados e tantos sem razão de ser.

Antigamente a mulher contratada para fazer as vezes de dona-de-casa era chamada empregada doméstica. Acharam um absurdo o termo. Passaram a chamá-la diarista (embora semanticamente esses dois termos não sejam a mesma coisa). Não satisfeitos, promoveram-na a secretária. Não perceberam, no entanto, que, na ânsia de serem politicamente corretos, de fazerem justiça vocabular, incorreram num caso clássico de lençol curto: deram um benemérito a uma classe em detrimento de outra. A antiga empregada doméstica foi alçada ao posto de secretária, coisa para a qual até curso superior há hoje em dia. Mais: até três línguas se exige. “Rebaixaram” uma classe que busca se especializar cada vez mais apenas por um capricho linguístico. Sim, ninguém me diga que com isso estão fazendo justiça. Reconhecimento de verdade é pagar salário justo, direitos, tratar com respeito, e não mudar um nome e acreditar que isso resolveu todos os problemas. Em vez de promover moralmente uma classe, “rebaixaram” profissionalmente outra.

Mas o ponto alto do abuso de eufemismos é o mundo corporativo. Ali nada se diz como de fato é. Na verdade, as empresas atuais criaram seu próprio jargão, assim como a classe médica (onde doença é patologia, dosagem é posologia) e as pessoas da lei (contestar é impugnar, negar é indeferir). Quem antes era empregado, já foi um dia funcionário, passou por colaborador e agora já é associado. Ora, você se associa a um clube, a um grupo de interesses afins. Na empresa você trabalha, não comunga de amenidades. Mais uma vez um nome que não condiz com o tratamento dispensado a quem se refere.

O arcaico professor, antigo instrutor, agora é o facilitador. Hoje ninguém faz curso. Faz solução educacional. E ele não tem custo. Agora é investimento. A profusão é enorme, e para quê? Um nome é apenas um nome. As atitudes é que vão determinar o que se traduz por eles. Essa atitude me lembra uma fábula de Esopo.


O Cavalo e o  Palafreneiro
(Esopo)
Ao palafreneiro1 que lhe roubava a cevada e ao mesmo tempo o acarinhava o dia inteiro,um cavalo declarou: - Queres mesmo que eu seja belo? Não vendas mais a minha cevada. Assim fazem as pessoas cúpidas2: procuram seduzir os pobres com propostas insinuantes e bajulação, enquanto os priva do necessário. 
 
1Indivíduo que cuida de animais em cavalarias
 
2Que demonstra cobiça material

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